tag:blogger.com,1999:blog-55762831036960443402024-03-19T04:17:03.678-07:00bruno barrioEntre el vivir y el soñar hay una tercera cosa. Adivínala.Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.comBlogger10125tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-82814404119610448352011-05-10T16:48:00.000-07:002011-06-07T12:54:28.217-07:00Livreto da Despedida<div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.0001pt; text-align: right; text-indent: 35.4pt;"><i><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12pt; line-height: 150%;"> Terminal (Houaiss): s.m. aquilo que termina, completa; final. estação final ou ponto de convergência de uma linha. adj. terminante, decisivo. </span></i></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"> <br />
<span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;"> </span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">A caminhoneiros, caixeiros-viajantes, turistas, fuzileiros, missionários, exilados forçados ou forçosos, aeromoças, golpistas, corpos diplomáticos, fugitivos; a andarilhos, enfim, nas suas variadas interpretações.</span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><br />
</div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">As horas coseram, devagar, a linha invisível que liga os momentos; o novelo dá seu derradeiro e tímido salto, um suspiro – um soluço. Finda uma era, o sentimento estará irremediavelmente objetivo. O álbum de fotos, congelado. Urge o átimo que encerra, que tampa, que veda: a despedida.</span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">Presume-se a necessidade de administrá-lo:</span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">Aconselhamos, primeiramente, não situá-la em lugares em que passamos todos os dias. É preferível o pitoresco ao que reporta à memória coletiva, uma vez que ela deve ser acompanhada de certo sentimento emancipador de inadequação que pode, com este simples cuidado, ser potencializado. Monumentos decadentes, sarjetas e saguões verde-musgo são sugestões de ambientes externos. Dos internos, poderíamos listar, por exemplo, antiquários, tabernas ou outros sítios que, por tradição ou negligência, remetam ao pó. Por outro lado, não se receitam localizações ditas presunçosas, ou seja, que desviem a atenção para si; privilegia-se o ordinário em detrimento do extravagante, pois o pensamento deve estar desanuviado. O asseio medíocre não subtrai, mas cuide-se para que haja o conforto mínimo. Sugerimos, por fim, o habitado ao ermo – a multidão, na sua busca cotidiana, acentua, surpreendentemente, a sensação de solidão. </span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">Recomenda-se luz afável; parca, se possível; bruxuleante, se dramático. O noturno é, em geral, melhor do que o diurno, sendo que o entardecer tange a perfeição; se de noite, o mesmo efeito de contraluz pode ser produzido por alguma fonte de ocasião como um farol de ônibus antigo (os bondes quase já não se encontram) ou um poste que pestaneja à medida tosse – eletricamente, como uma cigarra bêbada. Evita-se luz branca. Mais ao fundo de um abraço terno, difícil seria não imaginar um luminoso que carece de uma letra há pelo menos dois anos e em que já se pode ler qualquer outra palavra engraçada. Quando o cenário é intimista ou sente-se a necessidade de colorir, é preferível o cinza ao verde; o marrom ao vermelho. O marinho ao celeste. <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Em uma mesa ao lado, talvez o movimento de um cigarro lembre que a vida é dura e que todos temos nossas bengalas. Se um pouco mais escuro, com um bocado de sorte e uma gota de sonho, haveria, lá e cá, sombras pontiagudas como estalactites ou que convidassem à reflexão como as formadas por vitrais de igreja. </span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">As condições climatológicas privilegiam à medida que se aproximam das extremidades do termômetro, barômetro, pluviômetro, etc. Apesar disso, convém estar propriamente equipado e seguro, uma vez que o instante exige rigor. A bordo do charmoso vapor da Companhia Tropical Fluvial, haveria de se usar chinelos em razão da umidade escaldante. Na Estrada de Ferro Transpatagônica, caberia deixar à mostra nada mais do que a pupila. Apesar disso, há um ganho de encanto em determinadas situações: para uma chuva torrencial, um único guarda-chuva. Se venta, saia florida. Para lama, barra da calça baixa. Pequenos contratempos sublinham um momento intenso. No mais, se concilia a indumentária à prática pessoal. </span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">Sobre o que de um ponto vista normativo seria a etiqueta, três ou quatro indicações satisfariam. Não cabe aqui, de forma alguma, a conduta efusiva: independe do caráter da separação o decoro fundamental. Rondar os limites da temperança seria simpático. Os gestos devem ser contidos como uma aposta. Seria o olhar a única maneira de se conversar sobre cumplicidade? Talvez, se não houvesse o recurso da lágrima. Uma: preguiçosa, vacilante. O inverso, o pranto copioso, pode lograr o mesmo fim se natural, insuspeito e irrepreensível (a má execução, nesse caso, pode resultar em trágico cenário). Estando ali por perto, ouviríamos o ruído indistinto e, não sabendo precisar origem ou distância, ao virar, curiosos, nos depararíamos com tal cena, emocionando-nos também. </span></div><div class="MsoNormal" style="line-height: 150%; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;"><span lang="PT-BR" style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 150%;">Ainda. Pratos acidentais somam. Optamos por bebidas quentes. Agendá-la em dias de semana aporta relevo, sobretudo os inaugurais. Não é necessário investir em presentes. Apesar disso, uma vez inevitável, nunca se faria mais acertada que aqui a denominação “lembrança”. Há de ser dada no instante e aberta já se afastando do ser querido. O abraço apresenta protagonismo sobre o beijo. Interessa que nessa mesma semana tenha lugar algum fato histórico considerável, por questões de reminiscência futura. A sinalização é tanto mais memorável quando mais indecifrável for a língua em que estiver. Por fim, o horário deve, infalivelmente, ser checado em relógio público – de ponteiro. Se o sentimento transbordar, algo soará. </span></div>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-70533759319459247492010-07-19T09:12:00.000-07:002010-07-22T13:06:59.278-07:00O Melhor e o Pior da Europa<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: georgia;">Quiséramos dar um título mais apropriado a esta crônica, pois não se trata de um roteiro de viagens. Antes, de uma apreciação subjetiva das emanações invisíveis que nos visitam, a cada um, se sabemos estar dispostos a recebê-las. Em outras palavras, são impressões. Também não chega a ser um título banal. Quando dizemos “do” melhor, entenda-se no singular – é a melhor coisa de todas; e com o pior acontece exatamente o mesmo, mas ao contrário. Enfim, podemos dizer que é, de certo modo, um guia – o maravilhoso e o aterrador, se a intenção é ser dramático. Malditas sejam as introduções:</span><br />
<span style="font-family: georgia;"> O pior. Sem sombra nenhuma de dúvida, mas com o nublado natural que pressupõe a opinião, o pior da Europa é o vento da primavera. Diria o verso: “É primavera, te amo”. Faz-se desnecessário comentar, está tudo dito – imaginar a primavera é mais ou menos como pensar em um arco-íris. Poderia “o vento da primavera” ser título de uma poesia? – é bem provável. Isso só sublinha o caráter sedutor (desonesto) dessa arte. Quer dizer, podemos pensar que o vento da primavera passará assobiando uma doce melodia, entoando cânticos entre os nossos fatigados ouvidos. Mas a realidade não é assim de feliz. Explico:</span><br />
<span style="font-family: georgia;">Para nós, a primavera é uma espécie de implante místico de uma cultura ancestral, isso porque, sendo generoso, do Rio de Janeiro para cima, as estações se embaralham de tal modo que o montante é sempre um sol. Por outro lado, é sabido que, na Europa, a primavera mexe realmente com o humor das pessoas, pois se dá adeus ao inverno para adentrar numa escalada da temperatura que culminará diretamente nas férias anuais. É uma estação de passagem. E as passagens são turbulentas. Para quem não viveu isso, posdemos dar um equivalente trabalhado durante algum tempo e que hoje resulta de uma aproximação tocante.</span><br />
<span style="font-family: georgia;">Imagine-se no domingo de manhã tendo um filho de dez anos. Você acabou de acordar, está lendo jornal. O dia lá fora está frio; dentro, agradável. Ele vem, mansamente. Você está entretido pensando descompromissadamente se termina a matéria ou tira o pão da torradeira. Ele se aproxima sorrateiro e, sem que você se dê conta, encosta toda a superfície da mão geladíssima (grande demais para a de uma criança, pequena de mais para a de um adulto) nas suas costas recém saídas das cobertas. Você grita de raiva. (Como alguém que esteve nove meses dentro da sua barriga pode fazer isso?) Eis o vento da primavera européia. É um absurdo. O tempo começa a esquentar, você supostamente pode andar de camiseta. Paramos no “supostamente”...</span><br />
<span style="font-family: georgia;">O melhor. Superada a metade traumática, podemos finalmente nos deleitar com divagações lúdicas. Usando o mesmo raciocínio anterior, mas agora inversamente, temos que o melhor da Europa são as janelas.</span><br />
<span style="font-family: georgia;">- Ei menina, sorria, deixa eu ver essa janelinha!</span><br />
<span style="font-family: georgia;">- Amor, tenho uma janela no trabalho – finalmente vamos poder tomar aquele café com torta de limão no meio da tarde!</span><br />
<span style="font-family: georgia;">- Os olhos são a janela da alma.</span><br />
<span style="font-family: georgia;">Esta última, aparentemente mais vulgar, não é menos eloqüente. Por que não são os olhos a porta da alma? Seria até mais prático, já que, além do maior campo de visão, a simples substituição de termos descomplicaria o livre trânsito amores e amizades. Solução: a praticidade é inversamente proporcional à lógica dos sentimentos – qualquer um que já tenha acompanhado com atenção uma novela sabe disso. Uma janela sempre pode ser pulada, com o risco romântico da caída. Enquanto esta é um objeto ternamente pudico, uma porta é escandalosamente depravada.</span><br />
<span style="font-family: georgia;">Ora, os primeiros arquitetos europeus sabiam disso. Não me pareceria de forma nenhuma estranho que fossem eles os inventores do verso “Tô te esperando na janela!”. (Outra vez cabe a comparação – por que não esperar na porta, que seria, antes de tudo, o mais lógico?). As janelas desse pedaço de terra têm um encanto especial! É possível que grande parte dele provenha do seu tamanho. Se juntarmos a isso o charme das pequenas bancadas, o que é fato se tornaria ainda mais contundente. A idéia pode ser resumida, grosseiramente, com o cálculo que segue: o tamanho das janelas lá, se comparados ao das paredes, é inversamente proporcional à mesma relação nas nossas cidades. Dito mais simples: eles têm mais janela e menos parede; nós, mais parede e menos janela.</span><br />
<span style="font-family: georgia;">O pintor Bonnard dizia sobre seu ofício: “o nosso Deus é luz”. A janela, nesse caso, seria um portal ou uma oração que faz a casa encher-se de radiante doçura. E o que dizer das cortinas, de diferentes bordados, cores e temperamentos? Das flores – intimamente ligadas às janelas como um beijo une a um casal? Não pára por aí: serenata, Rapunzel e até a heroicidade dos bombeiros – a liturgia das janelas transborda passagens comoventes:</span><br />
<span style="font-family: georgia;"> - Tá chovendo lá fora...</span><br />
<span style="font-family: georgia;"> - Abre a janela para a gente ouvir melhor!</span></div>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-88916076681609512192009-12-23T07:37:00.001-08:002009-12-23T07:37:42.281-08:00Poema ligeiroNo bordel da vida<br />nasci com um coração<br />que nem encaixa no peito<br />que transborda na mão<br />e nem vermelho é!<br /><br />Vem-se com ele equipado.<br />Fosse antes um pulmão,<br />saca-rolhas acoplado<br />ou um punhado de fé<br />em pó, em barra, para<br /><br />os momentos decisivos<br />que são muitos, variados.<br />Fosse um fígado reserva<br />para o decolar da semana<br />ou de reserva, um feriado.<br /><br />Seria mais justo, mais são,<br />meio kilo de coragem,<br />radinho contra solidão,<br />receita de bolo de cenoura.<br />Dispositivo mais precisado:<br /><br />chiclete, pente, vassoura<br />para varrer o passado;<br />para selecioná-lo, tesoura.<br />Imagem de santo com oração.<br />Mas coração, tem mais enjoado?Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com8tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-19613206815591837572009-08-09T14:20:00.000-07:002010-06-18T04:45:49.560-07:00Limoeiro<a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiqa4fJ9ET470G3oQTwjqCz0WmW7veaagaWzzGYHQJGQ0aHNCXfVXhA5KvOCQqcio5Qyukb3_YlJE3aXlqRAFsT6lDZULzIunkcuNFau3jamNsED4yH72uOG1vzjRQ42G3Rk-6sUYQYnNw/s1600/24.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;width: 328px; height: 400px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiqa4fJ9ET470G3oQTwjqCz0WmW7veaagaWzzGYHQJGQ0aHNCXfVXhA5KvOCQqcio5Qyukb3_YlJE3aXlqRAFsT6lDZULzIunkcuNFau3jamNsED4yH72uOG1vzjRQ42G3Rk-6sUYQYnNw/s400/24.jpg" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5484078486528707106" /></a><br /><div align="right"><em>Para o tio e pintor Gene</em></div><br /><div align="left">O limoeiro espreguiça-se no quintal<br />Da porta aberta poderia-se vê-lo<br />Não fosse ainda muito cedo.<br /><br />Apesar disso, é verão<br />Que chegou pontualmente<br />Como deve ser.<br />E o calor já transborda no fresco da manhã<br /><br />Quem fechasse os olhos<br />Naquele átimo<br />Poderia mesmo escutá-lo<br />O estalar dos braços<br />O crepitar dos dedos<br />Poderia até ver<br />A euforia das formigas<br />Preocupadas com o estremecer do chão<br />No esticar das pernas<br /><br />Olhou então pela janela escancarada<br />Porque era lá que primeiro se via a família<br />Anunciada quase infalivelmente<br />Pelo cheiro do café<br /><br />Inspirou profundo e satisfeito<br />(para quem escutasse)<br />Parecia talvez uma oração<br />Quase inapreensível<br />Para que todos acordem bem<br />E o dia corra tranquilo<br />Como deve ser<br />Porque é verão<br />Embora ainda seja muito cedo. </div><br /><div></div><br /><div></div>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com10tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-67845013547952551572009-07-02T05:43:00.000-07:002009-07-02T05:46:20.021-07:00ComoçãoNão fosse essa chuva<br />Judiando de tudo<br />Aquilo que é<br />Insensível...<br /><br />Não se apresentasse<br />Tão invasiva<br />Na sua gentil<br />Indiferença...<br /><br />Não se dispusesse,<br />Tão solenemente<br />No dia de hoje,<br />gratuita...<br /><br />Não se confirmasse,<br />Na sua determinação<br />Tão visual,<br />Irretratável...<br /><br />Não fosse isso, aí não sei...Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-39350389319298375112009-06-20T16:23:00.000-07:002009-06-25T07:45:29.847-07:00Júlia<div align="justify">Júlia tinha feito até o momento 8 aniversários, sendo que o último tinha comemorado havia uns dois ou três meses apenas, ela mesma não sabia exatamente. No seu quarto tinha uma janela bem grande que quase nunca era fechada, isso porque ela acordava bem cedo logo quando a luz entrava; afinal quando se tem essa idade o tempo de um dia é pouco para aprender tudo aquilo que vai ser necessário nos anos seguintes. Da janela dava pra ver um montão de coisas como casas, ruas, o lado de um parque e uma igrejinha tímida, mas ver mesmo a escolinha vizinha ao prédio ela só conseguia nos dias de festa quando alguém a levantava sobre o parapeito ou quando seu pai estava muito bem humorado - ele subia ela em um banquinho e os dois ficavam ali comentando longamente a vida social escolar. Havia sim, o que é raro, algumas professoras bonitas e o pai podia se dar ao luxo de ter uma preferida porque era separado. O nome dela era Mariana (ela morava no prédio). Apesar de Júlia também gostar bastante dela, ela preferia as mulheres loiras, sobretudo as de cabelo cacheado. Ela mesma era loira, ou quase. Bom, preto o cabelo não era, disso ela tinha certeza e essa decisão lhe bastava enquanto não tinha idade para pintá-los ainda mais claros. Ah sim, o seu pai chamava-se Leonardo.</div><div align="justify">Ora, então Júlia acordou naquele mesmo horário de sempre, ela tinha aula, olhou pela janela e... absurdo, estava tudo cinza de novo. Não era justo, o tempo daquele jeito outra vez! De que servia a janela então? e foi, inconformada, despertar seu pai:</div><div align="justify">-Oi.</div><div align="justify">-Oi, bom dia Júlia. Tudo bem?</div><div align="justify">-Mais ou menos, pai.</div><div align="justify">-Algum problema?</div><div align="justify">-Não sei se é um problema. Acho que hoje acordei meio indisposta com o tempo de São Paulo.</div><div align="justify">-Como assim?</div><div align="justify">-Ah, é um tempo sem sentido, é um tempo desleal.</div><div align="justify">-Ai, Júlia. Só você.</div><div align="justify">-Eu contei.</div><div align="justify">-Contou o quê?</div><div align="justify">-Eu contei; hoje faz 10 dias que o tempo está assim. E veja bem que já estamos na primavera. Se continuar desse jeito é melhor tampar a janela do meu quarto e no lugar colocar um quadro do mesmo tamanho onde tenha um sol. </div><div align="justify">E ela saiu do quarto do seu pai pisando forte no chão e com uma cara muito, muito feia – inacreditável esse clima!</div>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-29416918538899271772009-06-17T18:26:00.000-07:002009-06-17T18:31:40.551-07:00Rua dos Bobos Nº 0 ou O Nadismo<div align="justify"><a name="2674342755182360840"></a>“Nada disso parece sair de um nadismo absoluto.Nadismo! Meu tempo criou a escola do nadismo, posterior aos falsos nudismos. Minha palavra é essa, minha lei essa, minha intensa pergunta é esta: que palavra superará ao nadismo?”</div><div align="justify"></div><div align="right">Shá</div><div align="justify"></div><div align="justify">Wikipédia:</div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify">O Nadismo ou Movimento Nadista nasceu de inseminação artificial. Acredita-se que teve início em 1974, no Timor-Leste. Quando criança, ria-se muito de quase tudo e achava que quando crescesse ia ser político, mas nada dizia. Como residência não teve nenhum lugar, excetuando, é claro, a hoje famosa Rua dos Bobos, nº 0. Seus professores acreditavam que ele sofria de distúrbio de déficit de atenção, o que não era totalmente verdade – a aula de que mais gostava era física (sobretudo no conceito de inércia, se comprazia deliciosamente refletindo sobre o vácuo) e odiava com todo o seu vocabulário a aula de inglês (realmente não entrava na sua cabeça o fato do verbo “it rains” ter sujeito).</div><div align="justify">Sua adolescência foi solitária. Pouco a pouco, foi tornando-se um jovem sisudo e afastado. Estando já em Beta nessa época, esqueceu-se de passar gilete quando deixava de ser imberbe. Foi por esse motivo que seus colegas, maldosamente, alcunharam-no de filósofo. No começo não ligava, mas um dia sentiu que aquilo estava indo longe demais, precisava tomar uma atitude – e não seria difícil no estado nervoso em que se encontrava; arregaçou as mangas, ergueu o punho e abriu uma enciclopédia. Lá encontrou, além de outros, os nomes de Nietzsche e Sartre. Leu boa parte da obra de cada um, compreendeu o conceito de Niilismo, mas não achou nada. Em seguida debulhou Camus e Schopenhauer e do Existencialismo e da Eudemonologia nada achou. </div><div align="justify">Já adulto, maduro e estudado, preferia votar sempre nulo. Foi por esse e por outros motivos que, quando começou a escrever seus melhores textos, acusaram-no de fútil, bossanovista, alienado e parnasiano. Mas o Nadismo sempre teve consigo a certeza de que, diferentemente das outras escolas, não priorizava a forma; também o conteúdo não priorizava. Era pura essência, afinal descendia do nudismo; naquela época era já quase luz. Em 2002, após uma parada cardíaca facilmente reversível, os médicos não se deram ao trabalho de fazer massagem cardíaca e em 20 de Maio veio a óbito. Não se ouviu mais falar, o Movimento esvaziou-se com o vento. </div>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-16270507252931861792009-06-11T06:55:00.000-07:002009-06-11T06:57:23.217-07:00O hospital público, a literatura e o cinema<div align="justify">Entrando pelo pequeno portão de ferro, tive o prazer de ver uma kombi-ambulância que parecia ser cenário de um filme da Segunda Grande Guerra. Toda verde musgo, as janelinhas pintadas de branco com uma cruz vermelha e a sirene em cima que parecia de brinquedo. O pátio externo do hospital assemelhava-se a uma cena de Rubem Fonseca: viaturas policiais, PMs alertas de arma na mão. Mais à frente do pronto-socorro estavam o prédio em reforma estática (isso lembra-me Realismo Fantástico) que abrigava os quartos para estadias mais longas. O saguão da recepção me lembrou alguns cômodos Dostoievskianos, a economia de móveis balanceada pela quantidade de funcionários públicos que estão ali apenas para serem funcionários públicos.<br />Subimos o elevador, 3º piso. O corredor, se houvesse mais leitos e materiais para abrigar enfermos ali mesmo, pareceria ao da primeira cena de Invasões Bárbaras. Mais funcionários conversando. No quarto em que minha tia-avó ficava, as camas assemelhavam-se a filmes manicomiais do começo do século passado. Camas de ferro grosso já mastigadas pela ferrugem, um cheiro fortíssimo de álcool com um não-sei-o-quê que me deixou enjoado mesmo depois de almoçar, jantar, etc - talvez seja o famoso Cheiro do Ralo.<br />-Oi, meu filho, que bom que vocês vieram. A tia tá mal, olha, não pára de vomitar.<br />- Tia, pense pelo lado bom. Se esse hospital é de urgência e a senhora ainda não foi operada, quer dizer que não está tão ruim assim.<br /> </div>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-13060052310771089372009-06-10T10:07:00.000-07:002009-06-17T18:32:50.594-07:00Questão (inacabado)<div align="justify">Caminhávamos baixo àquele céu magoado quando me salta ao coração um sentimento em forma de pergunta e vai direto aos lábios, sem passar pela cabeça, rota que aliás é a menos longa e mais natural. Perguntei a ela então o quê poderia existir de mais triste que um quarto sem janelas. Respondeu dizendo que certamente haveria algo pior; depois franziu as sombrancelhas, ficou alguns segundos em silêncio e fez um bico, atualizando que não estava certa mas que, a princípio, no seu modo de ver, deveria sim existir qualquer coisa ainda mais terrível. Nos encontraríamos dali a alguns dias e reiterou que, apesar do trabalho, seguramente viria com a resposta, se houvesse uma. Eu sabia que, em caso afirmativo, ela a traria - sempre foi muito precisa.<br />O tempo passou um pouco coxo e dali a exatas duas semanas soa o telefone - era ela. Me diz que naquela mesma tarde a resposta apareceu, assim "como alguém que tem vida própria e decide as coisas sempre ao seu ar". Eu estava ansioso – confessei. Ficamos de tomar um café no dia seguinte.<br />Ela começou dizendo que não gostava para nada de questões dialéticas, mas que foi a saída que encontrou, mesmo tendo feito o raciocínio inverso:<br />- A única coisa que pode existir mais triste que um quarto sem janelas é uma janela sem quarto.<br />Duvidei; incialmente, só para ter minha parte no mérito da questão.<br />- E posso saber por que uma janela solitária é assim tão triste?<br />- Não te parece óbvio? Um quarto sem janelas, apesar de triste, continua sendo um quarto. Já uma janela sem quarto são 4 pedaços de madeira pregados.<br />- Talvez possa ser chamada de moldura e isso seria uma salvação, ou ao menos uma alternativa. Algo como uma pessoa que tem um diploma mas trabalha em outro setor por falta de opção…<br />- Moldura de quê, de vento? Uma moldura pressupõe uma parede. Ou você já viu um quadro flutuando?<br />Precisava de uma idéia e eis que, com um gole profundo de café, me surge:<br />- Um quadrado de madeira sem parede ainda assim tem a sua liberdade, a sua autonomia, o que lhe permite ser original. Mas o quê dizer daquela caixa claustrofóbica de seis lados cerrados?<br />- Você não entende, meu caro, a questão é mais sensível - uma janela sem parede é a crise por excelência. Vou tentar explicar. Se um quarto sem janela fosse uma pessoa pobre, a janela sem quarto seria uma pessoa rica que não faz nada com o dinheiro. Entende?<br />Ela estava, como sempre, dificultando as coisas. Eu:<br />-Pense em uma janela sem quarto, ela pode ser colorida. Um quarto sem janela só tem uma opção: branco. É a apatia, a anemia, a indiferenca…<br />Ela, enfim, vacilou:<br />- É, talvez… mas por que não poderiam pintar o quarto? Talvez um azul claro desse um aspecto mais aprazível…<br />Ela estava distraída, mexendo a colher no que restou do café e eu, claro, aproveitei:<br />- Me desculpe falar dessa maneira, mas agora você foi inocente. Por que alguém que tenha um quarto sem janela o pintaria ao invés de usar o dinheiro para colocar uma, o que lhe proporcionaría, ao menos, o dobro da alegria?<br />-Talvez estivesse preso…<br />-E preso tem tinta?<br />Esse foi o momento em que ela se irritou de verdade:</div>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5576283103696044340.post-62356584944608606982009-06-10T09:36:00.000-07:002009-06-20T16:29:48.326-07:00Isabela - Curta metragem<p align="justify">Curta metragem feito para o concurso Claro Curtas. O tema era "Diversidade e Inclusão". As regras eram o tempo e a restrição de qualidade da imagem. Eu assino o roteiro.</p><p></p><p><iframe allowfullscreen='allowfullscreen' webkitallowfullscreen='webkitallowfullscreen' mozallowfullscreen='mozallowfullscreen' width='320' height='266' src='https://www.blogger.com/video.g?token=AD6v5dx3bm2XeliPn0O8ZE5hlIA3pku6wCh7YGybNkzoL3CmnrkEgiQEtMGoTgAOvj5z3Nb_iK8QGbT0hVgppgY8cw' class='b-hbp-video b-uploaded' frameborder='0'></iframe></p>Bruno Barriohttp://www.blogger.com/profile/03401859061036316469noreply@blogger.com1